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Foto do escritorLarissa Santos

A Cláusula de Eleição de Foro e o seu Controle Judicial

Firmar uma Cláusula de Eleição de Foro em contrato significa escolher o local para resolver eventuais conflitos decorrentes desse contrato.


A Súmula 335 do Superior Tribunal de Justiça confirma a validade da eleição de foro pelas partes, reafirmando a autonomia da vontade para a definição do local competente para o processo, conforme previsto no artigo 63 do Código de Processo Civil.


Entretanto, o §3º do mesmo artigo confere ao juiz a prerrogativa de considerar, de ofício, a cláusula ineficaz se evidenciada abusividade, resultando na remessa dos autos ao juízo do domicílio do réu.


Sobre isso, alguns questionamentos surgem, afinal, o que se consideraria abusivo? A declaração de nulidade pelo juiz não significaria violar o princípio da autonomia privada das partes?


  • Contratos de Adesão

Ao lidarmos com contratos de adesão, nossa jurisprudência entende que a cláusula de eleição de foro pode ser invalidada pelo Judiciário, caso seja comprovada a hipossuficiência ou a dificuldade de acesso à justiça por uma das partes, mediante a apresentação de dados concretos que evidenciem prejuízo na sua defesa.


Essa condição pode surgir mesmo em contratos de adesão firmados por pessoas jurídicas, de natureza tipicamente empresarial, desde que seja comprovado o prejuízo ou a dificuldade de acesso à justiça pela outra parte, não sendo a mera desigualdade de porte econômico entre as empresas suficiente para caracterizar hipossuficiência econômica apta a ensejar o afastamento do dispositivo contratual.


Considero a posição adotada pela jurisprudência adequada, pois em se tratando de contratos de adesão torna-se mais simples detectar abusividades, uma vez que estamos lidando com um tipo de contrato em que não houve igualdade e equilíbrio na estipulação conjunta das regras. Em vez disso, há apenas a aceitação por parte daquele que adere ao contrato.

Uma proteção adicional ainda surge em contratos de adesão de natureza consumerista, possuindo o consumidor a prerrogativa absoluta de escolher onde quer que sua ação tramite, diante da especial condição de vulnerabilidade e hipossuficiência que são presumidas na relação de consumo.


O entendimento atual do STJ afirma que, em casos de relação consumerista, a competência pode ser tanto absoluta como relativa, a depender da posição processual ocupada pelo consumidor. Nas ações em que figura como autor, a competência será territorial e, portanto, relativa, podendo o consumidor optar pelo foro que lhe for mais conveniente (seu domicílio, domicílio do réu, o próprio foro de eleição estipulado no contrato, ou, ainda, outro distinto se devidamente justificado).


Se for réu, a competência territorial terá contorno diverso e passará a ser tratada como competência absoluta, podendo o juiz declinar de ofício para o foro do domicílio do consumidor para viabilizar a facilitação da sua defesa, e assim invalidar o foro de eleição previsto no contrato de adesão.

A posição adotada por nossos tribunais está em conformidade com o ordenamento jurídico, afinal o Código de Defesa do Consumidor veio para estabelecer normas de proteção e defesa do consumidor, de ordem pública e interesse social, prevendo como seu direito básico a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova.


  • Contratos pactuados pelas partes em igualdade de condições

Nos casos em que as partes podem dispor livremente, de acordo com a sua autonomia e em igualdade de condições, sobre o foro que melhor lhes convém, não parece razoável que o Judiciário intervenha no autorregramento da vontade e invalide uma cláusula livremente escolhida por elas, alegando haver abusividade na escolha.


Ora, se foi livremente pactuada, presume-se que ambas as partes reconheceram que o foro escolhido não traria inviabilidade ou dificuldade de acessar o Poder Judiciário.


Aliás, sendo o caso de a própria parte alegar, posteriormente, abusividade no foro escolhido, penso que tal ato seria contrário ao princípio da proibição do comportamento contraditório e à boa-fé que rege as relações contratuais.


Adicionalmente, surge uma reflexão sobre a eleição aleatória de foro pelas partes. Esta pode sofrer controle do Judiciário?


Nossa jurisprudência, de forma consistente, vem permitindo o controle judicial da cláusula de eleição de foro aleatória, entendida como a cláusula que indica uma comarca que não guarda relação com o domicílio de nenhuma das partes, nem com o local de satisfação das obrigações, não tendo ligação com qualquer critério fático ou jurídico razoável.


Para esses casos, a cláusula de eleição de foro aleatória pode ser invalidada caso não haja justificativa plausível pela escolha da comarca no contrato, ao argumento de que configura abuso do direito de ação, à luz do art. 63, § 3º, do CPC, especialmente quando isso implica em forum shopping (escolha do órgão julgador mais favorável às teses das partes).


Segundo a nossa recente jurisprudência, o abuso de direito processual é matéria de ordem pública e, por isso, a possibilidade de declínio da competência de ofício, ainda que antes da citação, é medida essencial para o devido exercício da jurisdição. Por isso, a competência, ainda que relativa, está sujeita ao controle jurisdicional.


Mesmo que a Súmula 33 do STJ estabeleça a proibição ao juiz de declinar da competência de ofício quando esta for relativa, o STJ também já decidiu que é “inadmissível, todavia, a escolha aleatória de foro sem justificativa plausível e pormenorizadamente demonstrada” (AgRg no AREsp nº 391.555/MS, Rel. Min. Marcos Buzzi, j. 14/04/2015).


Por isso, recomenda-se que o foro seja escolhido de forma coerente com o contrato para garantir que a autonomia das partes seja respeitada.



Diante dessas considerações, temos que a discussão sobre o controle judicial das cláusulas de eleição de foro envolve a ponderação entre a autonomia contratual e a proteção das partes. Enquanto a jurisprudência estabelece critérios para invalidação em casos específicos, a coerência e a boa-fé também são princípios a serem considerados, especialmente em contratos livremente pactuados.

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